domingo, 22 de julho de 2007

Ensinar no Estabelecimento Prisional de Braga

Na prisão de Braga oito professores dão aulas de 1º e 2º ciclo, assim como apresentam actividades extra-curriculares com o objectivo de instruir e escolarizar os reclusos deste estabelecimento prisional, e ainda tendo em vista acalmar as possíveis tensões de quem vive em completa clausura.
O Estabelecimento Prisional de Braga estabeleceu uma parceria com a Escola Básica EB 2,3 André Soares em que professores desta escola dão aulas aos reclusos na prisão. Ao início, estes professores revelavam-se intimidados e receosos em leccionar para um público que consideravam perigoso e talvez pouco prestáveis a terem aulas. Contudo, a afinidade e uma relação positiva foi conseguida entre reclusos e professores, e estes assumem gostar da experiência assim como uma tremenda vontade em continuar a dar lá aulas. Aliás, tem sido registada uma percentagem de sucesso na ordem dos 60% e espera-se que para o ano haja também o terceiro ciclo que constituirá uma novidade no sistema prisional.

Esta foi uma notícia avançada pelo Jornal de Notícias de hoje e em que o próprio Director do Estabelecimento Prisional de Braga, Alves de Sousa, revela o sucesso do projecto afirmando o seguinte:

A escola é vivida dentro da cadeia. Sobretudo tendo em conta as dificuldades e a contenção. O ensino dentro da cadeia é fundamental para um trabalho social junto dos reclusos, a nível da educação em geral, do saber e da formação. Este tipo de proximidade do ensino só é possível com a vinda de professores do exterior, de uma forma fixa, permanente e prevista. São companheiros e ajudantes cá dentro. Tudo o que foi feito, a dinâmica introduzida, foi possível com este grupo de professores e técnicos de educação. Conseguimos fazer um conjunto de actividades que, sem eles, nunca conseguiríamos. Se se perder esta dinâmica, se os professores deixarem de vir, com a sua inovação e o seu conhecimento, não há vida através do exterior, não há esta lufada de ar fresco. Acaba-se esta interacção entre o que é interior com o que está lá fora.

Gostaria de referir aqui o meu apreço por esta iniciativa. Como sabemos, geralmente, os reclusos são indivíduos que além de possuírem um vocabulário muito reduzido, são desprovidos de regras e revelam uma certa indisciplina. São indivíduos que transgridem as normas e revelam comportamentos desviantes, inadequados e incorrectos em sociedade. Ao instruirem-se e ao pussuirem uma escolarização será um passo importante para que se tornem indivíduos providos de regras e respeitadores das normas, com responsabilidade e disciplina e, por consequente, dificilmente cometerão actos desviantes e reprimidos por lei.

Todavia, quero também aqui referir que o Estabelecimento Prisonal de Braga para além de ser pioneiro ao introduzir, no próximo ano, o 3º ciclo no sistema da cadeia, há bem pouco tempo mostrou-se como sendo o primeiro Estabelecimento Prisional em Portugal a levar a cabo o projecto VIP (Visiting In Prision) que é um projecto europeu que está a ser testado na cadeia de Braga.
A ideia é reforçar os laços familiares entre os reclusos e os filhos, para que a célula familiar não se desintegre. Isto através de um simples esforço de proximidade que inclui a criação de uma sala de visitas própria. Se correr bem será estendido a todas as cadeias do país. (Jornal de Notícias, 16 de Junho de 2007)
Tem, assim, por objectivo primordial eliminar as barreiras físicas que colocavam o recluso perante os filhos e outros familiares. No caso das crianças muitas sairíam de lá provavelmente a chorar. Havia o incomodo de estarem outros reclusos com os seus visitantes. Assim, cada recluso está individualmente com os seus filhos num ambiente parecido com o de casa.
Esta medida é, sobretudo, benéfica para os próprios filhos dos reclusos para que não sintam um certo constrangimento propiciado pelo ambiente prisional, e para evitar repetições de percursos de vida por parte dos descendentes.

Estabelecimento Prisonal de Braga: um exemplo de empenho na educação e formação dos seus reclusos.

2 comentários:

Gisela Rodrigues disse...

Ensinar aos reclusos tem duas vertentes, eu conheci dois casos que quero partilhar:
- no primeiro caso, o presidiário frequentou direito até ao último ano e utilizou a seu favor, ou seja da pior forma quando saiu,pois ficou com demasiados conhecimentos...
- no segundo caso, uma professora de português leccionou num estabelecimento prisional e disse-me que foi a melhor experiência profissional, porque os alunos estiveram muito interessados e encontraram uma forma diferente de ver a sua situação. Muitas das vezes para além de professora, era também conselheira e ajudou os detidos a terem coragem para enfrentarem as suas penas e esperarem pela sua saídas.

A maior parte deste tipo de alunos tem instrução básica ou nenhuma e é importante dar-lhes a oportunidade de encontrar uma vocação ou profissão para recomeçar a suas vidas quando saírem. No entanto, neste meio existem indivíduos sem escrúpulos cujo objectivos não são os melhores. É um assunto delicado que merece talvez maior acompanhamento.

Helena Antunes disse...

Obrigada pelo teu comentário Gisela!
Aquando do meu estágio curricular, numa instituição de reabilitação de toxicodependentes, tive a oportunidade de conhecer e contrastar com alguns utentes que haviam sido reclusos. De facto, alguns são indivíduos sem escrúpulos e muito manipuladores. Aprendi a conhecer um pouco indivíduos como eles. Mas são também pessoas muito carentes de afecto e de atenção. É preciso saber lidar com eles, e eu consegui essa empatia deles. Foi também uma experiência enriquecedora para mim, eles que são considerados pessoas frias e distantes, muitas vezes partilhavam ideias comigo, pediam-me opiniões e conselhos.

Daí penso que o facto de eles obterem instrução e escolarização enquanto estão na cadeia é muito benéfico para eles para que possam ter melhores oportunidades de emprego e de vida pessoal, familiar e social cá fora.